Sectores a incluir numa resposta multissectorial

Coordenação

  • Ativar ou criar uma comissão ou task force de coordenação da cólera que se reúna regularmente para coordenar a resposta, identificar problemas e mobilizar recursos destinados a resolver esses problemas. Essa comissão deve ser constituída por instituições governamentais relevantes, agências e autoridades locais, parceiros nacionais e internacionais, e ONG.
  • Com base na extensão do surto, essa comissão pode ser ativada aos níveis nacional e/ou subnacional.
  • Esta comissão recebe informação atempada e pública e distribui diariamente atualizações e relatórios da situação semanais que cobrem os indicadores da vigilância e a epidemiologia, WASH, mobilização social, logística e gestão dos casos.
  • Esta comissão deve estimar as necessidades de ordem geral, orientar e coordenar as ações e garantir que os recursos humanos e o material para a gestão dos casos, WASH, mobilização social e IEC estarão disponíveis quando e onde foram necessários.

Epidemiologia

  • Listas lineares padrão ou registos devem estar disponíveis e ser usados em todos os centros de tratamento.
  • Compilar dados diariamente nos centros de tratamento e descrever o surto em termos de quem é afetado, onde se localiza o surto e sua evolução para orientar as medidas de controlo. Partilhar os relatórios com a comissão de coordenação da cólera e com os sectores relevantes (tais como o WASH, gestão dos casos, mobilização social) para visar as ações.
  • Recolher informação sobre os casos suspeitos e as mortes por cólera na comunidade (por exemplo, entrevistar agentes comunitários de saúde, famílias de pacientes e chefes de aldeia; visitar o cemitério para verificar o número de sepulturas recentes).
  • Fazer investigações no terreno nas zonas afetadas para identificar pacientes nas comunidades (busca ativa de casos), explorar possíveis fontes de contaminação e identificar fatores de risco e vias de transmissão.
  • Se possível, coligir pontos do sistema de informação geográfica (GIS) e criar mapas das moradas dos pacientes e fontes de água, para ajudar a identificar as zonas de alto risco. A recolha de dados de geolocalização pode ser feita pelas equipas que visitam as casas dos pacientes para efetuarem atividades de prevenção. Partilhar esses dados frequentemente com o serviço WASH, as equipas de mobilização social e de gestão dos casos para orientar as atividades.

WASH

  • Avaliar as atuais condições e identificar os riscos de transmissão na comunidade, incluindo o acesso a água e saneamento seguros, higiene ambiental e principais comportamentos de risco.
  • Intervir rapidamente com medidas de WASH; garantir fontes de água potável devidamente cloradas nos pontos de utilização, a 0,5 mg/l de cloro residual livre (CRL). Essas medidas podem ser priorizadas em todas as zonas de elevada transmissão identificadas durante a avaliação dos riscos.
  • Os dados sobre a monitorização da qualidade da água deve ser partilhada com a comissão de coordenação.
  • As intervenções destinadas a garantir o acesso a água potável clorada podem incluir o apoio aos sistemas municipais ou tratamento da água doméstica.
  • A nível dos domicílios, fornecer sabão e produtos para tratamento da água. Transmitir mensagens WASH para prevenir a cólera. Esta ação é, muitas vezes, orientada para as casas e vizinhos dos pacientes admitidos nas estruturas de tratamento da cólera e deve ser coordenada com os colegas da promoção da higiene.
  • Visitar as casas dos pacientes com cólera (quando há poucos e os recursos o permitirem) e as comunidades afetadas para realizar a busca ativa de casos, recolher informação e fornecer educação em saúde, produtos de tratamento da água, sabão e SRO.
  • Trabalhar de perto com os colegas da gestão dos casos e da logística para garantir PCI adequada nas estruturas de tratamento.

Gestão dos casos

  • Criar imediatamente postos de reidratação oral (PRO) e unidades de tratamento da cólera (UTC/CTC). Assegurar que é feita a formação dos profissionais em matéria de protocolos de tratamento e que estão disponíveis materiais adequados e auxiliares de trabalho.
  • Garantir que os PRO e as UTC/CTC estão acessíveis às populações mais afetadas.
  • Trabalhar de perto com a epidemiologia e a logística para prever as necessidades de abastecimento e as pré-posicionar consoante a necessidade.
  • Formar os profissionais de saúde para o uso de TDR, colheita de amostras e procedimentos de transporte.
  • Trabalhar de perto com os colegas do WASH e da logística para garantir medidas adequadas de PCI nas estruturas de tratamento.

Vacina oral contra a cólera

  • Considerar a imunização com a vacina oral contra a cólera (VOC) para conter os surtos em curso (se implementada precocemente) e limitar a propagação do surto para outras zonas.
  • A VOC pode também ser usada para prevenir a ocorrência de surtos em contextos de alto risco de cólera (tais como, campos de refugiados e bairros degradados) e para reduzir a transmissão da doença e a sua incidência nas zonas endémicas ou em pontos críticos.
  • Definir claramente as zonas geográficas e as populações a visar, para vacinação com base na situação epidemiológica, fatores de risco e as infraestruturas e capacidades locais instaladas.
  • A VOC deve ser usada em conjugação com outras estratégias de prevenção e controlo da cólera.

Mobilização social e envolvimento comunitário

  • Investigar as infraestruturas de higiene e saneamento disponíveis na zona, incluindo o acesso e utilização desses serviços. Identificar as populações de risco e priorizar zonas para rápida intervenção.
  • Envolver as comunidades na transmissão de mensagens de promoção da saúde e prevenção da cólera e promover o tratamento precoce da diarreia.
  • As mensagens devem ser orientadas para o reconhecimento dos sintomas da cólera e como ela se transmite, encorajando comportamentos de procura precoce do tratamento e aumentando os conhecimentos sobre as práticas e estratégias de prevenção.
  • Transmitir as mensagens ao longo do tempo, para enfrentar os principais riscos e lacunas (identificados através das investigações no terreno e do controlo dos casos ou de estudos sobre conhecimentos, atitudes e práticas [CAP]), com ações positivas que podem ser exercidas (tais como, aumentar a cloração da água doméstica, levar imediatamente as pessoas doentes às unidades de saúde, melhorar a lavagem das mãos e preparar os alimentos com segurança).

Primeiros passos para controlar um surto de cólera

1. Ativar a comissão de coordenação da cólera

  • Criar uma comissão de coordenação multidisciplinar da cólera para a coordenação entre os sectores relevantes (nomeadamente, WASH, educação, comunicação e promoção da higiene) com representantes dos ministérios relevantes e das autoridades locais, agências internacionais, ONG e outras, conforme apropriado.
  • Estabelecer claramente a organização ou instituição líder da comissão. Normalmente, é liderada pelo Ministério da Saúde do país.
  • Durante os grandes surtos, poderá haver uma comissão e subcomissões nacionais para tratar de aspetos mais técnicos (como a vigilância, laboratórios, WASH, gestão dos casos, logística e mobilização social). Nem todos os membros de um grupo técnico participam nas reuniões da comissão nacional, mas pelo menos um representante de cada grupo deve participar, para assegurar a troca e coordenação da comunicação entre os vários sectores.
  • Se for ativada uma abordagem de agrupamento, facilitar a participação de todos os parceiros relevantes. Os papéis e as responsabilidades dos diferentes órgãos de coordenação devem ser claramente definidos.
  • Avaliar a necessidade de estruturas de coordenação subnacionais. Consoante a extensão e magnitude do surto, o tamanho do país e a sua estrutura de serviços de saúde, poderão ser criadas comissões semelhantes ao nível subnacional ou níveis mais periféricos.
  • A comissão de coordenação da cólera deve reunir-se frequentemente durante o período do surto (pelo menos, uma ou duas vezes por semana ou mesmo diariamente nas fases iniciais) devendo ser orientadas para a ação com base no contexto e evolução do surto.
  • A comissão deve tentar coordenar a angariação de fundos para a resposta de emergência.

Funções da comissão de coordenação da cólera

Esta comissão fornece orientações estratégicas, incluindo a rápida e eficiente elaboração, execução e monitorização do plano de resposta aos surtos, assim como a implementação e monitorização das atividades. As principais funções incluem :

  • Estimar a potencial amplitude do surto e o número esperado de casos, com base na avaliação dos riscos e nos dados epidemiológicos disponíveis. Identificar áreas prioritárias para todas as intervenções.
  • Identificar os recursos humanos e materiais disponíveis e necessários (ver Apêndice 3 – ferramenta de previsão do abastecimento ao nível distrital). Listar as necessidades não satisfeitas com o apoio externo necessário.
  • Criar unidades de tratamento da cólera nas zonas afetadas para garantir o rápido acesso ao tratamento. A comissão pode identificar um parceiro ou uma instituição com capacidade suficiente para o fazer ou prestar apoio adicional, se necessário.
  • Fornecer aos profissionais de saúde protocolos aprovados para a gestão dos casos. Se eles não existirem, poderá ser criada uma subcomissão para os elaborar.
  • Comprar e distribuir o material necessário em devido tempo, para evitar falhas de abastecimento.
  • Coordenar todos os parceiros envolvidos na resposta para evitar duplicação e sobreposições e para maximizar a eficiência e a eficácia da resposta em geral (ver Apêndice 4 – matriz para a coordenação das atividades de controlo da cólera).
  • Elaborar ou atualizar um plano multissectorial de resposta à cólera tão rapidamente quanto possível.
  • Criar e distribuir regularmente relatórios da situação (pelo menos, semanalmente) sobre a vigilância e epidemiologia, laboratórios, WASH, gestão dos casos e mobilização social. Incluir as necessidades identificadas, medidas implementadas e ações recomendadas. Partilhar com os doadores, o governo e o público.
  • Organizar sessões e reuniões regulares e fornecer regularmente informação concisa e atualizada sobre a situação epidemiológica e sobre a eficácia da resposta aos surtos, incluindo:
    • descrição e monitorização do surto: magnitude, evolução ao longo do tempo (gráficos epidemiológicos para mostrar a melhoria ou a deterioração da situação), extensão geográfica, incluindo mapas, outras características significativas (elementos como AR, taxa de letalidade [CFR] e outra informação relevante, como populações deslocadas ou difíceis de alcançar e pluviosidade ou inundações);
    • atualização regular das necessidades em recursos, tanto humanos como materiais; e
    • atividades de controlo empreendidas e planeadas.
  • Organizar ações de formação relevantes sobre vigilância, gestão dos casos, amostragem laboratorial, preparação de uma solução de cloro, medidas de PCI e outros tópicos, se necessário.
  • Produzir ou atualizar materiais de IEC adaptados ao contexto para a educação em saúde. Garantir as melhores práticas na comunicação eficaz dos riscos e usar meios de divulgação adequados (como rádio, cartazes, TV e líderes locais).
  • Mobilizar, formar e equipar os pontos focais comunitários (por exemplo, agentes comunitários de saúde, líderes locais, chefes de aldeia, chefes de família) para a transmissão de mensagens sobre a promoção da saúde, deteção rápida dos casos, gestão da desidratação em casa com SRO e comportamentos de procura de tratamento.
  • Arranjar provisões e assegurar o acesso a quantidades suficientes de água potável e saneamento em todas as zonas afetadas.
  • Avaliar o potencial uso da VOC e, se necessário, ajudar o Ministério da Saúde na preparação e apresentação da requisição às reservas mundiais. Realizar o microplaneamento e implementar e coordenar campanhas de VOC (ver Secção 9 – vacina oral da cólera).
  • Supervisionar, monitorizar e avaliar as atividades de controlo e as intervenções implementadas.

2. Elaborar um plano de resposta à cólera e preparação para as zonas de risco

  • Elaborar um plano integrado e multissectorial de resposta à cólera com base em avaliações dos riscos e das necessidades.
  • Objetivos:
    1. reduzir a mortalidade devida à cólera.
    2. reduzir a transmissão da doença nas zonas afetadas.
    3. prevenir e/ou minimizar o risco de introdução do surto em outra zonas de alto risco.
  • O plano de resposta à cólera deve incluir secções sobre coordenação, alerta e vigilância precoces, gestão dos casos e medidas de PCI, WASH, VOC, comunicação dos riscos e envolvimento comunitário, materiais essenciais e logística, medidas para prevenir a propagação para zonas e países limítrofes, e orçamento.
  • Cada secção deve ter atividades e indicadores claros para a monitorização e avaliação.
  • Integrar e reforçar as atividades de prevenção, sobretudo WASH, mobilização social e vigilância em zonas não afetadas mas em alto risco.

3. Implementar medidas de controlo

  • As medidas de controlo devem ser implementadas rapidamente, logo a seguir a uma indicação de um surto de cólera. As medidas de controlo visam reduzir a mortalidade e limitar a propagação da doença. Ver Secções 6 7 e 8.
  • As principais ações para reduzir a mortalidade incluem:
    • Criar unidades descentralizadas de tratamento da cólera (UTC/CTC) e postos de reidratação oral (PRO) para um rápido acesso ao tratamento.
    • Distribuir SRO na comunidade e às famílias. Explicar como preparar e administrar SRO.
    • Aplicar a deteção precoce, a triagem e a transferência dos casos graves para tratamento com fluidos IV.
    • Formar profissionais de saúde usando protocolos padrão de gestão dos casos e medidas de PCI.
    • Distribuir protocolos validados de tratamento às unidades de saúde e às UTC/ CTC.
    • Estimar o abastecimento, comprar e distribuir os materiais necessários para evitar faltas.
    • Informar o público acerca daquilo que as pessoas devem fazer se alguém adoecer com diarreia; incluir instruções acerca da reidratação com SRO, em casa ou a caminho de uma unidade de tratamento, e como e onde procurar tratamento imediato.
  • Principais ações para reduzir a propagação da doença:
    • Identificar possíveis fontes de contaminação e principais vias de transmissão para adotar intervenções.
    • Fornecer água potável em quantidade suficiente, melhorar o saneamento e a eliminação e gestão segura de dejetos.
    • Monitorizar regularmente as fontes de água para níveis de cloro livre e comunicar os resultados à comissão de coordenação; enfatizar as falhas na cloração.
    • Identificar as lacunas e promover condições e práticas de higiene (lavagem das mãos, tratamento e armazenamento de água em casa, preparação segura dos alimentos, enterros seguros) e comunicar os resultados à comissão de coordenação para ação imediata.
    • Reforçar as medidas de PCI e WASH nas UTC/CTC.
    • Reforçar a capacidade epidemiológica e laboratorial para a vigilância.
    • Realizar estudos epidemiológicos (tais como, estudos de CAP e controlo de casos) para identificar riscos e lacunas.
    • Comunicar frequentemente com o público através dos canais apropriados (incluindo comunicados de imprensa, TV, rádio, redes sociais) e reforçar o envolvimento comunitário.
    • Conduzir o mapeamento GIS dos casos, fontes de água e outras características para identificar regiões com elevado número de casos ou zonas emergentes de elevada transmissão, para orientar as intervenções.
    • Incluir a vacina oral da cólera (VOC) como parte das intervenções multissectoriais para controlar a cólera.

4. Comprar kits para a cólera

  • Os kits para a cólera ajudam os países a prepararem-se para um potencial surto de cólera e para apoiar a resposta inicial.
  • O pacote total consiste em seis kits diferentes, cada um deles dividido em vários módulos. Os kits e módulos podem ser encomendados separadamente.
    • Três kits destinam-se ao tratamento dos pacientes com cólera no seio das estruturas existentes ao nível central, periférico e comunitário.
    • Um kit fornece o material necessário para criar uma estrutura provisória para os cuidados aos pacientes quando não existe uma estrutura fixa no local.
    • Dois kits listam o equipamento necessário para a investigação dos surtos de cólera e para a confirmação laboratorial dos casos suspeitos.
  • Alguns itens – especialmente em relação à captação, tratamento e distribuição de água, eliminação e tratamento seguro dos dejetos e PCI – poderão não estar incluídos nos kits da cólera, sendo necessário comprá-los localmente.

Compras

  • As agências das Nações Unidas podem encomendar kits da cólera através da OMS ou do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).
  • As entidades fora do sistema das Nações Unidas devem contactar os Serviços de Compras da OMS em procurement@who.int. Introduzir as palavras “Kits da Cólera” na linha de Assunto da mensagem de email. Os Serviços de Compras da OMS fornecerão orientações para uma compra direta.

Para mais informação

  1. Cholera outbreak: assessing the outbreak response and improving preparedness. Global Task Force on Cholera Control 2010 Click here
  2. Technical Guidelines for Integrated Disease Surveillance and Response in the African Region. Second Edition 2010.Click here
  3. Revised cholera kits and cholera kit calculation tool. World Health  Organization 2019. Click here